Colégio Cataguases
Fotos: Arquivo Público e acervo de Joaquim Branco, sem referência de autoria, década de 1950.
Tarde de 29 março de 1910, uma numerosa massa popular nas proximidades da Estação Ferroviária, o trem misto das 3h55 da tarde se aproxima. Primeiro os apitos, depois a fumaça e as brasas. Há que se ter cuidado, porque os ciscos podem entrar nos olhos. Imagine, estragar a festa! O trem já está devagar estrugiram salvas de dinamites e foguetes em vários pontos e a banda de música atacou um vibrante dobrado”. Um clima de curiosidade, expectativa e uma certa euforia, risos alegres, comentários em tom de voz elevados!
O ano de 1905 foi marco para o desenvolvimento da cidade, com “o surgimento do plano de criação da primeira usina geradora de energia elétrica e da primeira fábrica de tecidos”. No entanto, a ausência de estabelecimento de ensino secundário conferia-lhe um certo sentido de inferioridade, o que sinaliza a importância dada à educação pelos membros daquela comunidade. A chegada do diretor, cercada de pompas e circunstâncias foi cuidadosamente preparada. Criaram-se comissões e elegeram-se os oradores, para as saudações de boas-vindas para o Padre Theófilo Bento Salgado.
O Padre Theófilo era procedente de uma cidade próxima, Pomba, e vinha acompanhado de seus sete discípulos. Os “neo-conterrâneos apearam do trem entre as mais significativas mostras de regozijo popular” e “fez-se silêncio para ouvir os oradores”
(A EPOCHA in O Estudante, 1950, p.11).
Concluída essa parte do programa, o grande séquito saiu: à frente os alunos das escolas públicas, dispostos em filas. Em seguida o novo diretor e sua comitiva, as comissões populares organizadas para a recepção, a “Euterpe Cataguasense” e por fim os populares. O destino desse grupo era a chácara da Granjaria, onde se achava instalado o Gymnásio. Em todo o caminho não “cessaram de estrugir foguetes e salvas de dinamite. Às pessoas que visitaram o novo estabelecimento foi servido um copo de cerveja (Cerveja Volvi, de fabricação local, a época, e mencionada por Oswaldo Barroso (Depoimento em Memória e Patrimônio Cultura, 1988, p.84), e já passavam das 18 horas quando o Padre e seus companheiros retornaram à cidade para jantar no Hotel Vilas.
A inauguração do Ginásio e da Escola Normal de Cataguases aconteceu em 31 de março de 1910, na antiga chácara da Granjaria e em 2 de abril o número de alunos matriculados era de trinta. O pensamento de instalar em Cataguases um estabelecimento como esse antecede essa data. Em 15/10/1898, a Lei n.º 86, da Câmara Municipal, no seu Art.1o dizia: “Com o título de Ginásio de Cataguases será criado e mantido pela Câmara Municipal desta cidade, um estabelecimento de instrução secundária, modelado pelos estabelecimentos congêneres, custeados pelo governo do Estado”. Promulgada pelo Agente-Executivo Municipal Dr. Antônio Cavalcanti Sobral, essa iniciativa não saiu do papel.
O sistema federativo e governo instituído pela Constituição da República de 1891 estabeleceu, em termos da legislação educacional, uma dualidade de sistemas: a União deveria “criar instituições de ensino superior e secundário nos Estados” e “prover a instrução secundária do Distrito Federal”. Seria da competência dos estados prover e legislar sobre a educação primária. O que acabou ocorrendo, na prática, foi que a União ficou com criação e controle da instrução superior e o ensino secundário em todo o país, bem como todos os níveis de instrução no Distrito Federal, e, aos Estados, coube criar e controlar o ensino primário e profissionalizante, nessa época representado pelas Escolas Normais para moças e Escolas Técnicas para rapazes. Esse sistema que vinha se mantendo desde o Império, oficializava a distância entre a educação da classe dominante (escolas acadêmicas e escolas superiores) e a educação do povo (escola primária e profissional), retrato da organização social brasileira. No entanto, a composição da sociedade, naquele momento, já não permitia mais esta forma de simplificação. Uma nova sociedade despontava com a República.
De 1890 a 1920, o Poder Público se interessa apenas pela manutenção de estabelecimentos padrão que sirvam de modelo para as demais escolas secundárias do país. A União mantinha o Colégio Pedro II, o Ginásio Nacional, com sistema de internato e externato e, em alguns estados, um único ginásio nas capitais.
A iniciativa privada foi responsável pelo ensino secundário no período ao qual estamos nos referindo e por muitos anos mais. Temos informações positivas e seguras de que um grupo de capitalistas e comerciantes da nossa praça, a cuja frente acham os Srs. Manoel Ignácio Peixoto, João Duarte Ferreira e Antônio Henriques Felipe, está organizando uma Associação para o elevado e profícuo fim de fundar nesta cidade um Ginásio e uma Escola Normal (O Cataguases, 17 de outubro de 1909 (COSTA, 1977, p. 7).
O Colégio de Cataguases, antigo Ginásio de Cataguases e, posteriormente, Ginásio Municipal de Cataguases, foi fundado em 1910, pelos senhores Manuel Inácio Peixoto e João Duarte Ferreira, que organizaram, para explorá-lo, a firma Peixoto, Duarte & Cia. (Documento Inventário - Acervo da Escola Estadual Manoel Inácio Peixoto).
Quem são esses senhores que concretizam o tão esperado colégio? Imigrantes portugueses que iniciaram a vida no Brasil como trabalhadores braçais na construção de estradas de ferro. Trabalharam duro. Fixaram-se em Cataguases e prosperaram.
O Sr. Manuel Inácio Peixoto teve família numerosa e o Sr. Duarte não teve filhos. O primeiro se fez industrial e o segundo administrador e político. Eram homens de negócios, mas esse empreendimento não parece ter sido realizado com a intenção de lucro.
Os primeiros anos do colégio não foram estáveis. O tão aclamado primeiro diretor, Padre Theófilo, não permaneceu. “Um ano, mais ou menos, depois da inauguração” o colégio passa para a orientação do Colégio Granbery, de Juiz de Fora, que designa Mr. W.B. Lee para seu reitor, e esse assume as funções em 9 de fevereiro de 1911 nela permanecendo até 27 de novembro de 1913. Funcionavam na época, quatro cursos:
1. Colegial (3 anos);
2. Fundamental (3 anos);
3. Agrícola Profissional (4 anos) e;
4. Normal (2 anos).
Em discurso (O Estudante, 1950, p.1), o Professor Antônio Amaro, assim se refere a Mr. Lee: “cidadão probo, profundamente bondoso que depois de uma atuação profícua de três anos” entregou-lhe as chaves do estabelecimento.
No início de 1914, o colégio filia-se ao Ginásio São José de Ubá, de propriedade e direção dos professores José Januário Carneiro e Antônio Amaro Martins da Costa. Este, na impossibilidade de transferir-se para Cataguases, delega ao Professor Arnaldo Carneiro Viana a direção do colégio, função esta exercida em comum acordo com o Prof. Amaro, e na qual permanece até janeiro de 1917, ano em que o Prof. Antônio Amaro muda para Cataguases e assume a direção.
Em 1923 o ginásio passa para a propriedade do Professor Antônio Amaro com a compra do terreno e edifício. São suas as seguintes declarações: "Transferindo-nos em janeiro de 1917, jamais nos afastamos do velho Ginásio de Cataguases. Confundiram-se nossas existências, uma vez que com igualdade de ânimo participávamos de seus dias de alegria e de adversidade[...] também as coisas têm sua vida como a dos homens, se lhes sobram, às vezes, dias de sol, não lhes faltam, entretanto, dias de tristeza e de amargura" .(O Estudante, 1950, p.1).
Em 10 de fevereiro de 1925, a Escola Normal é desmembrada e passa para a direção das Irmãs Carmelitas da Divina Providência.
Em 1927, o Ginásio de Cataguases, passa a chamar-se Ginásio Municipal de Cataguases.
Em 1934, foi arrendado aos Padres Agostinianos, mas já no ano seguinte retornava às mãos do Professor Antônio Amaro. É sob a sua direção do Professor que o colégio adquire prestigio regional, insere-se na história do movimento modernista pela atuação de alguns de seus alunos e, em termos legais, incorpora algumas conquistas.... (continua)
Fonte: As representações do Colégio de Cataguases e de suas práticas educativas nas memórias de seus ex-alunos(Década de 1950). Mestre em Educação pelo Programa de Pós Graduação da Universidade Estácio de Sá. Área de Concentração: Educação e Cultura Contemporânea, 2005 - Eloísa de Castro Silva
Criação e Desenvolvimento
Welington Carvalho