Pedro Dutra e Flávia Dutra

No dia 25 de abril de 1893, nascia na Fazenda da Aldeia, em Sereno, município de Cataguases, Pedro Dutra Nicácio Neto. Filho do político e advogado Astolfo Dutra Nicácio e de Antônia Dutra Resende, ambos descendentes dos desbravadores das matas mineiras. Como a maioria das crianças da época, aprendeu a ler e escrever em casa com a ajuda dos pais. Aos doze anos, seguiu para o Ginásio São José e depois para o Colégio Abílio, em Niterói, onde terminou seu curso de Humanidades. Mais tarde, ingressou na Faculdade de Direito, abandonando-a no segundo ano por falta de recursos.


Três anos depois do nascimento de Pedro Dutra, nascia em outra família, Flavia Pacheco Fernandes, no dia 10 de junho de 1896, na Fazenda Jequitibá, Sapucaia, Rio de Janeiro. Filha de Eponina Werneck Pacheco e Paulino José Fernandes, organizador da primeira companhia telefônica que se instalou em Cataguases em 1912.


Flávia chegou de mudança com sua família a Cataguases em 1904, aos oito anos de idade, logo foi matriculada na escola da professora Honorina Ventania. Passou depois para o antigo Colégio Nossa Senhora do Bom Conselho e, em 1910, ingressou no Ginásio Cataguases. Formando-se professora, passou a lecionar no Grupo Escolar Coronel Vieira até seu casamento.


Desde o momento da chegada a Cataguases, a família Fernandes tornara-se amiga da família Dutra, possibilitando uma proximidade entre os jovens Pedro e Flávia, o que resultaria em um longo e feliz casamento que se realizou em 1918.


Foto: Pedro e Flávia Dutra - Acervo Público - sem referência de data


Fonte: Livro - Vultos da Modernidade em Cataguases, por Luiz Fernando Leitão, Joaquim Branco, Gilmar Moreira Gonçalves e Odete Valverde

Filhos do casal Pedro Dutra e Flávia Dutra

Mas a alegria seria ainda maior, quando nasceu Astolfo Dutra Nicácio, o primeiro filho do casal, a 7 de agosto de 1921.

Nos primeiros dias de outubro de 1924, Dona Flávia estava no fim de sua segunda gravidez e Pedro tinha que viajar a trabalho. Ao retornar a Cataguases, e, ao desembarcar do “Expresso”, surpreendeu-se com a estação repleta de amigos que o saudavam com palmas e vivas. Ele, sem saber do que se tratava, quando viu seu cunhado Jarbas Cortes, perguntou: “Tem gente nova lá em casa? É menino ou menina?” – Não, Pedro, por enquanto não nasceu ninguém, é que você foi indicado para candidato a deputado pelo Partido Republicano Mineiro”.

Dias depois, a 8 de outubro de 1924, chegava ao mundo a tão esperada criança, que para sua alegria era uma menina e recebeu o nome de Martha Fernandes Dutra.


O casal de filhos sempre foi a maior alegria de Pedro e Flavia Dutra. Talvez em todos os atos a favor do próximo que ambos desenvolveriam durante toda a vida estivesse a esperança de que seus filhos pudessem viver em uma sociedade mais justa. Que os filhos dos menos favorecidos tivessem as mesmas alegrias e oportunidades que os seus.

Tanto amor sempre foi recíproco, pois até hoje Astolfo e Martha se emocionam intensamente ao falar de seus queridos pais. Aos dois não precisavam ensinar nada. Bastava que observassem seus genitores para serem pessoas de comportamento elegante, mas sem perder a simplicidade no trato com os outros, independentemente da classe social.

Astolfo seguiu a profissão do pai; tornou-se excelente advogado e político. Enquanto Martha, casou-se com um primo irmão de sua mãe, José Alípio Machado Fernandes.


Foto: Astolfo Dutra Nicácio Neto e esposa (Acervo de Joaquim Branco)


Fonte: Livro - Vultos da Modernidade em Cataguases, por Luiz Fernando Leitão, Joaquim Branco, Gilmar Moreira Gonçalves e Odete Valverde


Pedro Dutra - Diretor do Departamento do Instituto da Previdência dos Servidores do Estado - IPASE

Em 1956, são eleitos dois amigos seus para Governador do Estado, Francisco Bias Fortes e para Presidente da República, Juscelino Kubitschek. Juscelino nomeia Pedro Dutra para Diretor do Departamento do Instituto da Previdência dos Servidores - IPASE do Estado e Bias Fortes atende seu amigo com obras no município de Cataguases. São construídas a ponte sobre o rio Sabiá, na antiga estrada que ligava Cataguases a Leopoldina, e a Praça de Esportes. Estes melhoramentos são inaugurados em agosto de 1956 quando da visita do Governador Bias Fortes a Cataguases.


No período em que Pedro Dutra dirigiu o Departamento de Previdência do IPASE, e posteriormente o Departamento de Seguros, criação sua, foi um administrador que cuidou dos interesses dos seus segurados e funcionários com o maior zelo e espírito público. Em seus despachos, clamava pelo cumprimento da legislação trabalhista, exigindo das empresas privadas creche para os filhos de seus funcionários e um restaurante para os servidores do Instituto.


Decorrido um ano da administração de Pedro Dutra no Departamento de Previdência, a Divisão de Seguro Social melhorou o pagamento das pensões e pecúlios às viúvas dos seus contribuintes e, graças ao grande incremento dado aos seguros privados, a arrecadação do Departamento aumentou 40% e o número de seguros ampliou-se em 36% em relação ao ano anterior, 1956.


A criação da Agência do IPASE em Cataguases foi outra iniciativa de Pedro Dutra. Sob a argumentação de que nossa cidade era o centro de vários municípios, pela sua posição geográfica e facilidade de comunicação, conseguiu a aprovação pelo Conselho Diretor do IPASE da criação da Agência.


Foto: Pedro Dutra no coreto da Praça Rui Barbosa, 1932 - Coleção Pedro Dutra - imagens captadas na cidade de Cataguases no período de 1931 a 1934 com o objetivo de documentar ações e instruir processos da Prefeitura Municipal contra terceiros durante a administração do prefeito Pedro Dutra Nicácio. Nestas fotos constam anotações do prefeito como assunto, autor e data.

Os processos nos quais estão inseridas algumas fotografias são oriundos do acervo judiciário da Comarca de Cataguases, documentos institucionais hoje sob a guarda da COARPE - Coordenação do Arquivo Permanente do Tribunal de Justiça de MG, Belo Horizonte.


Fonte: Livro - Vultos da Modernidade em Cataguases, por Luiz Fernando Leitão, Joaquim Branco, Gilmar Moreira Gonçalves e Odete Valverde



Pedro Dutra se afasta do IPASE e do cenário político

Em 1960, Pedro Dutra afasta-se do IPASE, volta a advogar e, por ocasião do golpe de 1964, impetra diversas habeas corpus em favor de presos políticos. Trabalhou como advogado para alguns de seus adversários políticos em Cataguases com grande eficiência, sem considerar as posições de cada um, procurando, expondo o problema, sempre empenhado na defesa do direito do seu constituinte. Mesmo afastado da política, não se esquecia dos amigos e correligionários; de vez em quando lá ia ele a Belo Horizonte, sempre com os bolsos cheios de papéis, para conseguir um pedido de nomeação ou a transferência de uma professora para um lugar melhor.


Foto: Pedro Dutra e Tancredo Neve na rua do Clube do Remo - Acervo Público - sem referência de data



Fonte: Livro - Vultos da Modernidade em Cataguases, por Luiz Fernando Leitão, Joaquim Branco, Gilmar Moreira Gonçalves e Odete Valverde



Morte de Pedro Nicácio Dutra

Em janeiro de 1965, a conselho médico, Pedro Dutra segue para o Rio de Janeiro. Falece no dia 28 de janeiro de 1965 e vem a ser sepultado em Cataguases, com a presença de representante do governo do Estado e de autoridades dos municípios vizinhos, cercados de incontável multidão que se despedia de seu político maior.


Em 1993, o então prefeito Tarcísio Henriques Filho promoveu na cidade, com grande pompa, os festejos do centenário de nascimento de Pedro Dutra. Aquele que foi advogado e político, plenamente. Nele fundiam-se as qualidades e a cultura necessárias para bem exercer a defesa dos mais simples direitos às causas mais complexas. Era respeitado e temido pelos seus pares advogados, e sempre se manteve independente e correto perante os juízes. Homem público por natureza, tanto na função de advogado como de político, soube ser coerente, defensor das causas dos mais humildes. Sentia-se responsável pelo povo de sua cidade.


Foto: Pedro Dutra - (acervo de Joaquim Branco) - sem referência de data


Fonte: Livro - Vultos da Modernidade em Cataguases, por Luiz Fernando Leitão, Joaquim Branco, Gilmar Moreira Gonçalves e Odete Valverde



Pedro Dutra - Agente Recenseador e retorno à Faculdade de Direito

Em 1920, Pedro foi nomeado Agente Recenseador em Cataguases. Com a ajuda de Flávia Dutra, fez todo o recenseamento do município, percorrendo as ruas da cidade e dos distritos a cavalo para coletar dados, enquanto ela em casa preenchia os mapas. Ambos recensearam também espécies vegetais da região.

Incentivado pela esposa, Pedro Dutra voltou à Faculdade de Direito, onde concluiu, em 1921, o curso que havia interrompido, “Tu me animaste a prosseguir até a conquista do diploma de Bacharel em Direito. Estudaste os pontos comigo” – foram suas palavras de agradecimento a Flávia Dutra.


Apesar de toda a felicidade, o início da vida profissional de Pedro Dutra como advogado foi árduo; não havia estágios para estudantes durante o curso, e, além disso, ele tinha que competir com profissionais competentes com Sandoval de Azevedo e Antônio Lobo de Resende Filho, que comandava a política local. Mas, sempre pode contar com o apoio da esposa e a alegre companhia do pequeno Astolfinho.

Dedicou-se com afinco à advocacia. Sua inteligência vivaz aliada a uma grande capacidade de comunicação faria do destemido Pedro Dutra um brilhante advogado. No mesmo período, entrava para a vida política, elegendo-se vereador pelo Distrito de Cataguarino.


Foto: Pedro Dutra - (Coleção Pedro Dutra) - sem referência de data


Fonte: Livro - Vultos da Modernidade em Cataguases, por Luiz Fernando Leitão, Joaquim Branco, Gilmar Moreira Gonçalves e Odete Valverde


Vida política de Pedro Dutra

Como deputado estadual (1924/1927 e 1928/1930), Pedro Dutra tornou-se um político batalhador e conhecido por nunca pedir nada para si e sempre para Cataguases e seus correligionários. Flávia Dutra, de seu lado, sempre presente na vida profissional e política do marido, permaneceu atenta a todas as coisas que diziam respeito a suas vidas comum, seus negócios, seus filhos e às amizades.


Quando, em outubro de 1928, o Presidente de Estado de Minas Antônio Carlos de Andrade esteve em Cataguases, ficou hospedado em sua casa. Boa anfitriã, com grande espírito de organização, mesmo tendo se instalado na nova casa há apenas nove dias, Flávia providenciou tudo: cardápios, acomodações, roupa de cama e mesa para a comitiva e cedeu seu quarto, que tinha banheiro privativo, para o visitante. Nesta ocasião, a pedido de Pedro Dutra, o Presidente Antônio Carlos, autorizou a criação do Horto Florestal e ainda, junto com o prefeito Lobo de Resende, solicitou a Antônio Carlos a ampliação e a modernização dos serviços de abastecimento de água e a autorização para construção do Grupo Escolar Guido Marlière. Solicitações que foram prontamente atendidas.

 

Nomeado prefeito em 15 de maio de 1931 pelo presidente mineiro Olegário Maciel, Pedro Dutra permaneceu na Prefeitura até o 2 de março de 1933. Em apenas 22 meses na gestão construiu a estrada Cataguases X Laranjal, assim como a estrada Cataguases X Muriaé e os grupos escolares de Sinimbu, Guaiaçu, Cataguarino, Vista Alegre e Joaquim Vieira.


Durante o período da ditadura de Vargas (1937 – 1945), Pedro Dutra, afastado do exercício político, voltou para Cataguases e retomou suas atividades de advogado. Foi o melhor período de sua vida profissional. Advogou em todos os municípios vizinhos e fez mais fama. Nesta época, comprou a fazenda Itajaí, desmembrada da fazenda de Turiaçu, onde o casal construiu uma espaçosa casa-sede e vinte uma casa para colonos, cada uma delas com uma sala, dois quartos, cozinha e banheiro com fossa asséptica.

 

Com a deposição de Getúlio Vargas em agosto de 1945, é convocada a Assembleia Constituinte para dar nova ordem jurídica ao país. São organizados partidos nacionais, e Pedro Dutra, a convite de seu amigo Celso Machado, ingressa no Partido Social Democrático (PSD) em 2 de dezembro de 1945, sendo eleito deputado federal com expressiva votação. Dos trabalhos da Assembleia Constituinte, Pedro Dutra participou ativamente, defendendo a participação dos empregados nos lucros as empresas e nas discussões sobre a instituição do júri.


Em 1947, funda junto com alguns amigos a Rádio Cataguases, cuja licença conseguiu graças ao seu prestígio e influência. Presidiu a emissora por longos anos, sendo ela um eficaz instrumento de atividade social e de propaganda política.


Em 1950, Pedro Dutra candidatou-se novamente á Câmara Federal, mas não se elegeu. Voltou ao seu escritório de advocacia; no entanto nunca esqueceu os interesses de sua terra natal. Conseguiu recursos da União a construção da segunda ponte sobre o Rio Pomba, a ponte nova, obra do Departamento Nacional de Estradas de Rodagem.


Recebeu em sua casa Juscelino Kubitscheck e o Marechal Lott, quando candidatos à presidência da República. Numa dessas visitas, Pedro Dutra pediu a Juscelino, então governador do Estado, a criação de mais um grupo escolar para a cidade e este, encantado com a cultura e delicadeza de Dona Flávia Dutra, ordenou ao seu secretário: “Assim que chegarmos a Belo Horizonte, leve-me o decreto criando, em Cataguases o Grupo Escolar Flávia Dutra”.


Foto: Almoço com o Major Lott (Acervo de Joaquim Branco)


Fonte: Livro - Vultos da Modernidade em Cataguases, por Luiz Fernando Leitão, Joaquim Branco, Gilmar Moreira Gonçalves e Odete Valverde


Flavia Dutra entra no cenário político

Em 1959 era a vez de Dona Flávia Dutra se enveredar pela política, sendo eleita vereadora, a primeira mulher no município a ocupar tal posição com a maior votação até então para o cargo, 1200 votos. Mulher culta, à frente de seu tempo, lia com fluência o inglês e o francês. Era conhecida e respeitada por toda a população. A todos recebia e tratava bem, e estava sempre voltada para os interesses dos mais pobres. Nessa legislatura, que iria até 1962, os vereadores renunciaram a seus subsídios, e em consequência nada recebeu pelo desempenho do mandato.

 

As atividades políticas de Flávia Dutra não se limitavam apenas ao município de Cataguases. Quando iniciou a campanha para eleição do Presidente da República que sucederia a Juscelino, Flávia foi apresentada à esposa do Marechal Lott para ser a presidenta nacional do Comitê Feminino pró candidatura Lott. Com ajuda de outras senhoras, fundou inúmeros comitês no Rio de Janeiro, Juiz de Fora e Brasília. Esteve presente em comícios em vários Estados do país. Trabalhou de maneira incansável: “D. Flavia tem sido dinâmica e firme no seu trabalho, sem publicidade, quieta, estendendo seus comitês no Estado da Guanabara e fora dele, viajando de avião a qualquer hora, falando em comícios e inauguração de comitês, com desenvoltura de uma jovem de vinte anos”. (Jornal do Comércio, Rio de Janeiro, 18.07.1960).


Foto: Flavia Dutra - Acervo de Joaquim Branco - sem referência de data


Fonte: Livro - Vultos da Modernidade em Cataguases, por Luiz Fernando Leitão, Joaquim Branco, Gilmar Moreira Gonçalves e Odete Valverde



Morte de Flávia Dutra

No dia 06 de outubro de 1988, falecia Flávia Fernandes Dutra no Rio de Janeiro. Mulher que soube muito bem, ao lado do marido, conduzir sua tarefa pública e cumprir sua missão. “Para avaliar o prestígio do casal junto às famílias cataguasenses, basta consultarmos a longa lista de afilhados de batismo ou de casamento que minha mãe relacionou cuidadosamente, desde 1916 até 1965”, declarou sua filha Martha Dutra Fernandes.


Toda essa empatia junto à população tinha uma razão de ser. Numa época em que a maioria das mulheres estavam mais confinadas à esfera doméstica, Flávia Dutra, com seu idealismo, sua força de espírito e seu carisma, marcou presença, afetiva e efetiva na vida de todos os seus conterrâneos de coração e contemporâneos, tornando-se, juntamente com seu marido Pedro Dutra, uma figura viva no imaginário do povo cataguasense.


Foto: Flávia Dutra - (Acervo de Joaquim Branco) - sem referência de data


Fonte: Livro - Vultos da Modernidade em Cataguases, por Luiz Fernando Leitão, Joaquim Branco, Gilmar Moreira Gonçalves e Odete Valverde



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